Para muitos, o nome Glenn Irwin será desconhecido. Natural da Irlanda do Norte, este piloto de 32 anos – mas que aparenta ser bem mais jovem – tem sido o representante Honda em destaque no BSB (campeonato britânico de SBK) esta temporada, onde ocupa neste momento a sexta posição (perdeu 4 lugares na última ronda em Donington) com a sua Fireblade da Honda Racing UK.
Muito divertido e extrovertido, esteve sempre em “amena cavaqueira” com os jornalistas durante a apresentação internacional da Honda CBR 1000 RR-R Fireblade SP 30º Aniversário, e não perdia a oportunidade para “se meter com o mais velhote” John McGuinness, com quem também falámos (ver entrevista aqui no site). Não deixa de parecer estranho, para nós portugueses, observar a forma como estes pilotos britânicos olham para as provas de road racing, com um misto de excitação e medo, mas é toda uma mentalidade completamente à parte daquela que vivemos nos países mais latinos. Neste preciso momento Glenn Irwin está a fazer a sua estreia no TT da Ilha de Man, a quem desejamos toda a sorte para cumprir sem sobressaltos esta corrida como rookie.

Motociclismo – Glenn, como são feitas todas as alterações do road racing para os circuitos? Como te adaptas mentalmente?
Glenn Irwin – Bem, nos circuitos quando cais não pontuas, e no máximo podes magoar-te um pouco. No road racing se cais podes morrer, pelo que logo aí é uma grande diferença. Por isso, no road racing pilotamos até a um ponto em que sabemos que não vamos cair. É claro que no campeonato britânico também não quero cair, pois perco pontos. Direi que a forma mais natural de se cair na competição é perdendo a frente, mas no road racing tento entrar em curva de forma suave sem forçar demasiado os travões. Na saída, aí sim faço como nos circuitos tradicionais e forço bem na aceleração. Depois, quando volto aos circuitos tenho de me habituar novamente a sentir o pneu a ser esmagado no limite, a sentir o “chatter”, etc. No road racing não chego a sentir isto, apenas dou tudo à saída das curvas como fiz no North West e sim, é um pouco assustador (risos).
Motociclismo – É nos circuitos que te sentes mais confortável?
Glenn Irwin – São duas coisas distintas. Nos circuitos existe menos ansiedade, não estamos sempre a pensar no final de domingo. No road racing por vezes desejamos que o tempo passe depressa, logo para o final da semana, para termos a certeza que ainda estamos cá… Estamos mais confortáveis nos circuitos, mas no road racing os fãs estão próximos de nós, especialmente no North West onde corri em casa, e parecia um estádio de futebol a puxar por mim. É algo muito especial, mas existe menos medo durante um fim de semana de britânico de SBK. E quem diz que não tem medo no road racing tem um grande nariz, é um grande mentiroso.
Motociclismo – Para a semana vais para a Ilha de Man…
Glenn Irwin – Sim f***, e já estou assustado (risos). É claro que estou excitado, mas as semanas que antecedem a prova fazem-nos pensar um bocado. Depois, quando estamos na moto e somos apenas nós e a moto é uma boa sensação.

Motociclismo – Treinas de alguma forma especial para o road racing?
Glenn Irwin – É difícil, claro. Fisicamente o treino não muda muito, pois estamos a fazer mais uma prova durante a temporada. Mentalmente, já tive a ajuda de um treinador no passado, agora já não pois já tenho mais experiência e posso aplicar o que aprendi anteriormente. Quando vou para uma prova quero ser preciso, manter a concentração, quero ser rápido mas suave, sem cometer erros. Por isso tento focar-me na precisão, na ausência de erros. Mas a atmosfera na road racing é incrível, é como se fosse a melhor droga do mundo, é incrível. Por isso gosto de ir uma semana mais cedo para a prova, e guio com a minha família pelo percurso, e gosto de ir aos restaurantes da zona, para falar com as pessoas e absorver todo aquele ambiente. Mesmo nas manhãs das provas gosto de andar um bocado pela pista, falar com as pessoas e começar a receber toda a adrenalina. Sinto que preciso de tudo isto para entrar no ambiente.
Motociclismo – Em relação a este evento, estamos aqui por causa dos 30 anos da Honda Fireblade, o que estás a achar da tua moto este ano?
Glenn Irwin – Sim, adoro a moto. A primeira vez que andei no modelo foi em 2020, numa versão de estrada, e fiquei logo impressionado pois parecia uma moto de corrida. Depois fomos para o Qatar, para a apresentação internacional do modelo. Foi a minha primeira vez lá, e bati o tempo do Kiyonari com a antiga moto de competição. E não há muitas motos de estrada capazes de andar logo assim a este ritmo, por isso fiquei impressionado. Depois há estilos que se adaptam melhor que outros. Eu sempre gostei endireitar as motos cedo e usar muito o acelerador para virar a roda traseira, e nesta área a moto funciona muito bem, patinando mas andando para a frente. A travagem também funciona muito bem mas como nem tudo é perfeito, no miolo das curvas de média velocidade sinto que a moto pode melhorar, quando levamos muita velocidade em curva e ainda é cedo para endireitar a moto. E falta um pouco de “feeling” nessa área, mas a moto é muito boa e está cada vez melhor. Nem nos podemos esquecer que o projeto é ainda bastante recente, e tivemos que nos daptar rapidamente a outra marca de pneus, face a outras marcas que já usavam os mesmos pneus.
Motociclismo – No road racing é mais fácil colocar a moto com a afinação ideal?
Glenn Irwin – Bom, depende! Na terça-feira, primeiro dia do North West, foi tão assustador… Temos de seguir a 200 milhas por hora numa estrada comum, de gás a fundo, e isso pode ser a melhor sensação do mundo, mas na terça tivemos vento lateral e estávamos a utilizar uma moto com uma carenagem maior e então… f***, não foi nada divertido. No sábado, com menos vento, fizemos sempre 200 milhas na reta, 205 milhas por hora por vezes (n.d.r. são 329 km/h…), mas com vento tive de cortar acelerador muitas vezes senão ia parar ao campo! No road racing o mais importante é a estabilidade a alta velocidade, pois as velocidades são elevadas e o asfalto nem sempre é liso, pelo que é preciso confiança e temos de trabalhar o corpo na moto. Tudo isto para dizer que no North West acabei para mudar para a carenagem tradicional que uso aqui no BSB e a estabilidade melhorou logo imenso, apesar de ter menos proteção aerodinâmica. Mas a moto deixou de ser um kite! O vento e os ressaltos na estrada fazem toda a diferença no road racing e as passagens de caixa têm de ser muito precisas.

Motociclismo – Agora no TT tens o John McGuinness como companheiro de equipa. Como é conviver com uma grande lenda enquanto tu estás ainda a começar no road racing?
Glenn Irwin – Ele tem sido uma grande ajuda. Estamos em fases diferentes da carreira mas o John ainda poderá obter bastantes sucessos no TT deste ano. Nesta fase da vida ele está mais descontraído e partilha mais informação, o que antes não acontecia, por isso tem me ajudado muito e eu tenho sido uma esponja a absorver toda a informação. Eu falo muito, mas quando o John fala eu apenas ouço (risos). E a experiência dele a afinar a moto – e têm-me dito que os ressaltos em alguns locais da Ilha de Man são tipo pista de MX – será certamente muito útil para mim. Sempre fui um fã do John e é um sonho ser colega de equipa dele. Ele é um tipo normal, e se eu no North West tinha sempre os fãs comigo, acho que na Ilha de Man vou relaxar mais um pouco com os fãs em volta do John (risos).
Motociclismo – E os teus objetivos para esta época e para o futuro, tanto na velocidade como no road racing, quais são?
Glenn Irwin – Neste momento estou em segundo no campeonato britânico de SBK (n.d.r. Baixou alguns lugares no final do fim de semana) e existem pistas em que consigo ser bem competitivo. Hoje por acaso as coisas não me correram bem na qualificação, pois errámos com a eletrónica e vi o meu irmão cair forte à minha frente, mas no geral podemos lutar pelas vitórias em várias pista. Gostava de lutar pelo campeonato e espero que apanhemos tempo seco nas nossas melhores pistas. Para o TT não tenho objetivos, para além de me tentar divertir e chegar a casa inteiro. E vou-me divertir de certeza, pois preparei bem a prova e vou continuar a aprender muito nos dias em que irei lá estar. Logo vejo como será, mas não vou lutar pela vitória, isso é mais que certo. E se me perguntarem se eu preferia ser campeão do mundo de SBK ou campeão britânico de SBK, vencedor do North West e do TT no mesmo ano, então eu direi que preferia a segunda opção! Se eu tiver uma boa oportunidade de ir para o mundial com a Honda é claro que não irei recusar, mas adoro correr aqui no britânico. Talvez um dia destes possa fazer um wild card no mundial ou substituir algum piloto lesionado, e percebo que ao fazer road racing isso talvez me corte um pouco as hipóteses de fazer Mundial de SBK, mas atualmente gosto muito deste mix de provas que estou a realizar.